A entrevista de hoje para o livro Policiais Penais da Paraíba – PERFIS, é com Anna Amélia, diretora da cadeia da cidade de Santa Luzia. Nos conte sua história Anna.
Qual foi a impressão nos primeiros dias ou meses no sistema prisional paraibano e por onde começou, qual unidade?
Eu nunca tinha entrado em uma penitenciária antes, eu jamais havia sonhado ser Policial Penal, estava concluindo meu curso superior, buscava independência e de repente, lá estava eu, uma menina de 23 anos, enfrentando meu primeiro plantão de 24 horas na Penitenciária Feminina de Campina Grande, um ambiente totalmente novo para mim. Confesso que senti um misto de nervosismo e curiosidade. Tudo era muito diferente do que eu imaginava na faculdade ou em qualquer estágio que tivesse feito até então. No começo, a sensação era de insegurança, mas também de determinação. Precisei me adaptar rapidamente às rotinas, às pessoas e às situações inesperadas que surgiam a todo momento. Tive que manter a calma, pensar rápido e garantir que tudo estivesse sob controle, mesmo quando o ambiente ficava mais tenso. E, para ser sincera, a noite foi assustadora. O silêncio pesado, os barulhos estranhos, a sensação de que algo poderia acontecer a qualquer momento... tudo isso me deixou bastante nervosa. Foi um período difícil, mas também uma oportunidade de testar minha coragem e minha resistência. Ao longo do plantão, percebi o quanto esse universo é complexo e cheio de nuances. Cada momento foi uma oportunidade de aprender algo novo, de entender melhor as dificuldades e a resiliência das pessoas que vivem e trabalham ali. No final, saí daquele dia com uma sensação de conquista e uma nova perspectiva. Me senti mais madura, mais consciente da realidade daquele ambiente e de mim mesma. Apesar dos desafios e do medo que senti nos primeiros dias, descobri que tinha força e coragem para enfrentar qualquer situação, e isso me deixou ainda mais motivada a seguir aprendendo e crescendo na profissão que me escolheu.
Passados esses anos, em quais unidades prisionais atuou e quais as funções/cargos exerceu? Nos conte tópicos de sua trajetória até aqui.
Desde o início da minha carreira, tive a oportunidade de atuar em várias unidades prisionais, enfrentando diferentes desafios e aprendendo bastante ao longo do caminho. Meu primeiro contato foi na Penitenciária Feminina de Campina Grande, onde trabalhei de janeiro de 2009 até 2010. Lá, passei por muitas dificuldades, principalmente devido abusos por parte da gestão local na época. Foi um período difícil, mas que me ensinou muito sobre resistência e perseverança.
Depois, em 2010, fui transferida para a Penitenciária Padrão de Campina Grande, onde permaneci até 2015. Nesse período, trabalhei inicialmente no serviço administrativo, o que me proporcionou uma visão mais ampla do funcionamento do ergástulo.
Posteriormente, durante a gestão do Secretário Carlos Mangueira, fui nomeada para cuidar dos serviços jurídicos e presidir a Comissão de Sindicância dali, uma das responsabilidades mais desafiadoras e importantes que assumi. A comissão tinha a missão de apurar faltas disciplinares e decidir sobre punições para os presos, que afetam diretamente o histórico prisional do interno e seu processo, gerando grandes consequências, o que é uma tarefa delicada e de grande responsabilidade.
Na época, a Penitenciária Padrão de Campina Grande era conhecida como "Máxima", justamente por receber presos de alta periculosidade, considerados muito perigosos e com histórico de violência. Isso tornava o trabalho da comissão ainda mais exigente, pois as decisões tinham impacto direto na segurança de todos, incluindo os próprios internos, os servidores e a sociedade. Como mulher, jovem, assumir essa posição foi um grande desafio, pois muitas vezes enfrentava olhares de dúvida ou resistência, de descrédito e dada a complexidade do ambiente prisional e a percepção de que esse tipo de responsabilidade era mais comum para homens.
No entanto, sempre acreditei na importância de exercer meu papel com firmeza, honestidade, justiça e ética, buscando garantir que as punições fossem justas e que a segurança fosse preservada. Presidir essa comissão me ensinou muito sobre liderança, sobre a importância de manter a calma sob pressão e de tomar decisões equilibradas, mesmo em situações extremamente tensas. Foi uma experiência que reforçou minha determinação de atuar com responsabilidade e de contribuir para um ambiente mais seguro, justo e legal dentro do sistema prisional.
Após essa experiência, fui transferida novamente para a Penitenciária Feminina de Campina Grande, em 2016, assumi o cargo de diretora adjunta daquela Penitenciária Fiquei nessa função até 2019, quando fui exonerada e passei a trabalhar na Cadeia Pública de Picuí. Nesse período, enfrentei outros desafios, especialmente pela falta de estrutura física daquela unidade, o que dificultava bastante o trabalho e o bem-estar de todos.
No mesmo ano, fui nomeada diretora da Cadeia Pública de Jauzeirinho. Em dezembro, fui removida para a Cadeia Pública de Santa Luzia, onde trabalho até hoje. Tenho dedicado meus esforços para melhorar as condições da unidade e garantir a segurança de todos. Recentemente, em maio de 2024, fui nomeada diretora dessa Cadeia Pública, uma responsabilidade que assumo com muita dedicação e esperança de promover mudanças positivas.
Ao longo desses anos, aprendi muito com cada experiência e sigo firme no compromisso de fazer a diferença na área prisional, sempre buscando melhorias e o bem-estar de todos envolvidos.
Qual leitura você faz hoje do sistema prisional paraibano em comparação ao primeiro ano e quais lições/aprendizado você destacaria na sua trajetória profissional?
Desde que ingressei no sistema prisional da Paraíba em 2009, como a primeira turma de concursados, pude acompanhar de perto uma verdadeira transformação. Naquele início, encontrei um sistema com pouca estrutura, muitas dificuldades e desafios a serem superados. Era um momento de muito esforço e esperança, pois, não apenas eu, mas vários, sabíamos que poderíamos fazer a diferença. Ao longo desses anos, crescemos muito. Foi investido na capacitação do seu quadro funcional, buscando sempre aprimorar conhecimentos e habilidades para oferecer um serviço mais eficiente e humano. Houve aparelhamento, equipagem dos servidores com armamento e munições, garantindo que o trabalho fosse exercido com mais eficácia. Além disso, procede-se uma escolha qualificada para ocupar cargos de direção, assumindo responsabilidades cada vez maiores na gestão do sistema. Hoje, diferente do início, os diretores são policiais de carreira, qualificados e experientes, o que fortalece ainda mais a gestão e a segurança do sistema penitenciário. Também foram criados grupos especiais, fortalecendo a segurança e a eficiência das ações. Ao olhar para trás, vejo o quanto evoluímos. Cada passo dado foi fundamental para transformar o sistema penitenciário da Paraíba em uma estrutura mais sólida, segura e preparada para os desafios de hoje e do futuro. E tudo isso só foi possível graças ao esforço de toda a equipe, que nunca desistiu e sempre acreditou na capacidade de melhorar. O maior aprendizado que tive ao longo dessa jornada foi não perder a esperança, pois dias melhores chegam para aqueles que confiam, buscam e perseveram.
Nos fale um pouco mais sobre a missão de ser gestora de uma unidade prisional, que depende muito de uma equipe articulada, qualificada e compromissada.
Atualmente estou como diretora da Cadeia Pública de Santa Luzia e gerenciar uma Unidade Prisional masculina como mulher é, sem dúvida, um grande desafio, mas também uma experiência extremamente enriquecedora e emocionante. Enfrentar esse papel exige força, coragem e muita determinação, pois lidar com um ambiente predominantemente masculino, cheio de complexidades e responsabilidades, requer uma dose extra de resiliência. Cada dia traz novas dificuldades, mas também a oportunidade de mostrar que o compromisso, a dedicação e o amor pelo que fazemos podem transformar qualquer cenário.
Tenho muito orgulho de dizer que somos sinônimo de sucesso, e tal fato se deve, principalmente, ao quadro funcional comprometido e dedicado que tenho ao meu lado. Os policiais penais que trabalham comigo são verdadeiros heróis silenciosos, que enfrentam diariamente as adversidades com coragem e profissionalismo. São eles que, com esforço e dedicação, garantem a segurança, a ordem, disciplina e a dignidade dentro da unidade. Cada um deles representa a força e a esperança de um sistema penitenciário mais justo e humano.
Essa jornada me ensinou que, mesmo diante de desafios imensos, o trabalho em equipe, o respeito e a dedicação fazem toda a diferença. Sou grata por poder contar com profissionais tão comprometidos, que não medem esforços para cumprir sua missão com excelência. Juntos, estamos construindo uma história de superação, de força feminina e de confiança de um sistema penitenciário cada vez melhor. E, acima de tudo, aprendemos que, com união e tenacidade, é possível transformar obstáculos em conquistas.
Para você, o que representa ser policial penal, integrar a mais jovem Força de Segurança Pública da Paraíba?
Ser policial penal e fazer parte da mais jovem Força de Segurança Pública da Paraíba é uma honra e uma grande responsabilidade ao mesmo tempo. Essa missão representa o compromisso de proteger, garantir a segurança e promover a dignidade dentro do sistema penitenciário, contribuindo para a construção de uma sociedade mais justa e segura. Ser parte dessa nova força significa estar na vanguarda das mudanças, inovando e buscando sempre o melhor para a população e para os colegas de trabalho. Como a mais jovem força de segurança, temos a oportunidade de mostrar que podemos fazer a diferença, enfrentando desafios com coragem, dedicação e profissionalismo. Cada dia é uma chance de aprender, evoluir e reafirmar o nosso papel fundamental na manutenção da ordem e na reintegração social. Essa posição também simboliza esperança de um sistema mais eficiente, humano e transparente, onde o respeito e a valorização do profissional são prioridades. Para mim, ser policial penal na Paraíba é mais do que uma profissão; é uma missão de vida, uma oportunidade de transformar realidades e de mostrar que, mesmo sendo a força mais jovem, temos força, garra e determinação de sobra para fazer a diferença. É uma oportunidade de deixar um legado de coragem, dedicação e esperança para as futuras gerações de policiais penais.
Quais os desafios seus enquanto agente essencial nesse processo de formação da Polícia Penal e por consequência na evolução do sistema prisional do estado?
Como agente essencial na formação da Polícia Penal e na evolução do sistema prisional do estado, enfrento diversos desafios que são ao mesmo tempo obstáculos e oportunidades de crescimento. Um dos principais desafios é me adaptar a uma nova estrutura de segurança, implementando práticas modernas e humanas no sistema penitenciário. Além disso, preciso lidar com a resistência natural às mudanças, sempre buscando me capacitar e me atualizar constantemente para desempenhar meu papel da melhor forma possível. Outro desafio importante é garantir a segurança de todos — colegas, internos e a sociedade — enquanto trabalho para promover uma abordagem mais humanizada e de reintegração social. Também tenho a responsabilidade de ajudar a construir uma identidade forte e reconhecida para a Polícia Penal, com respeito e valorização, o que exige muita dedicação, perseverança e coragem. Apesar de tudo isso, sei que meu papel é fundamental para tornar o sistema prisional mais eficiente, justo e humano. Cada obstáculo superado é uma vitória que contribui para a consolidação de uma nova fase na segurança pública do estado. Meu esforço é essencial para que essa transformação seja duradoura e positiva. Faço parte de uma história de mudança, esperança e progresso, e sei que meu trabalho faz toda a diferença nesse caminho de evolução.
Opine sobre essa produção literária dos últimos anos específica sobre o sistema prisional, a Polícia Penal. Você considera relevante contribuir, ser personagem, autor de artigos, de livros neste campo, escrevendo as primeiras páginas da história quase centenária da Seap-PB?
Na minha opinião, a produção literária dos últimos anos sobre o sistema prisional e a Polícia Penal tem sido fundamental para ampliar o entendimento, promover debates e fortalecer a nossa história nesse campo tão importante. Acredito que é extremamente relevante contribuir ativamente, seja como personagem, seja como autora de artigos ou livros, para escrever as primeiras páginas de uma história que está sendo construída com muita dedicação e esperança.
Foi algo muito emocionante para mim ser autora do livro "Mulheres que fazem acontecer no sistema penitenciário da Paraíba", especialmente por ter escrito a crônica "É cor de rosa, choque". Essa experiência foi uma oportunidade única de compartilhar histórias de mulheres que atuam nesse universo, mostrando força, coragem e determinação.
Sinto que, ao compartilhar experiências, reflexões e conhecimentos, posso ajudar a consolidar uma narrativa mais justa, humana e eficiente para a Secretaria de Administração Penitenciária da Paraíba (Seap-PB). É uma oportunidade de deixar um legado, de participar da transformação do sistema e de contribuir para que essa história seja marcada por avanços reais e duradouros. Para mim, fazer parte desse processo literário é uma forma de fortalecer a nossa identidade e de inspirar futuras gerações a continuarem lutando por um sistema prisional mais digno e humano.
Já escreveu ou pretende escrever livro autoral sobre temáticas relacionadas ao sistema prisional?
Na verdade, nunca escrevi um livro inteiro, mas tive a oportunidade de participar como autora de uma obra muito especial chamada "Mulheres que fazem acontecer no sistema penitenciário da Paraíba". Meu destaque na publicação foi a crônica "É cor de rosa, choque", que aborda temas importantes com uma perspectiva única.
Tenho um grande interesse em continuar produzindo literatura, especialmente sobre a história da Secretaria de Administração Penitenciária da Paraíba (Seap-PB) e a profissão de Policial Penal. Acho que essas histórias merecem ser contadas e compartilhadas, e estou animada para contribuir com mais textos e relatos que possam inspirar e informar as pessoas sobre esse universo tão relevante.
PERFIL
Nome completo: ANNA AMÉLIA DANTAS DE ALMEIDA FEITOSA LOPES
Local e data de nascimento: CAICÓ-RN 26/04/1985
Formação: Cursos/Especializações DIRETO – UFCG / PÓS GRADUADA EM DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL - UEPB
Ingresso no Sistema Penitenciário da Paraíba: JANEIRO/2009
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