quarta-feira, 13 de agosto de 2025

Pena Justa: primeiro monitoramento nacional aponta avanços e desafios




O primeiro informe de monitoramento da versão nacional do plano Pena Justa, entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF) na terça-feira (12/8), mostra um quadro de avanços e de desafios a serem superados nos próximos três anos. O relatório foi produzido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com apoio da Secretaria Nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça e Segurança Pública.


O monitoramento inicial conforme o prazo semestral estabelecido pelo STF relata a construção de mecanismos de governança do Pena Justa, além de testar fluxos de coleta, validação e consolidação das informações. As metas do Pena Justa são contabilizadas anualmente, e por esse motivo, o primeiro monitoramento completo ocorrerá apenas em fevereiro de 2026. Os dados foram obtidos por meio de formulários enviados a órgãos federais selecionados e aos Comitês de Políticas Penais dos estados, uma vez que diversas metas nacionais dependem do engajamento de instituições locais.


O relatório monitorou 338 dos 366 indicadores previstos. No bloco federal, 12,4% dos 202 indicadores medidos foram considerados implementados. No conjunto dos estados, a média de execução variou de 38% no eixo mais avançado a 30% no menos desenvolvido. Entre as informações prestadas pelas unidades da federação, Ceará, Distrito Federal e Piauí registram as maiores taxas de execução, enquanto Paraná, Rio Grande do Sul e Sergipe aparecem na base do ranking. Sergipe e o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania não responderam dentro do prazo e, por isso, só aparecem nos recortes relativos a base de dados nacionais.


“O primeiro ciclo estabelece a linha de base do plano e mostra onde já temos entregas e onde precisamos ajustar governança, prazos e apoio técnico. A consolidação de fevereiro de 2026 vai trazer um quadro mais completo, com metas e indicadores mais bem calibrados com a realidade dos estados. Além disso, o monitoramento anual vai conferir as informações a partir de evidências, o que pode resultar em variações nos resultados informados pelos órgãos responsáveis”, afirma o juiz coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), Luís Lanfredi.


De acordo com o secretário Nacional de Políticas Penais, André Albuquerque, o Pena Justa também ganha novo impulso a partir da entrega dos planos estuais e distrital ao STF, cujo prazo terminou também nesta terça-feira (12/8) . “Fizemos um importante trabalho de construção de estruturas de governança e de monitoramento neste primeiro semestre que serão essenciais para que as engrenagens do plano funcionem pelos próximos três anos, a altura do desafio nacional que se impõe ao Pena Justa”.


Controle da entrada e gestão de vagas

Em dezembro de 2024 o Brasil tinha uma taxa média de ocupação prisional de 1,35, o que significa que, para cada 100 vagas, havia 135 pessoas privadas de liberdade, com variações significativas em cada unidade da federação. Nesse período, 27% da população prisional — cerca de 183 mil pessoas — estava em prisão provisória, conforme apontam dados do Levantamento de Informações Penitenciárias da Secretaria Nacional de Políticas Penas (Senappen).


Por essa razão, o eixo 1 do Pena Justa reúne ações para racionalizar a porta de entrada, recalcular e organizar a ocupação das unidades, revisar situações processuais e ampliar alternativas penais. No semestre, 61 dos 65 indicadores previstos foram medidos, com execução média de 35,4% entre os estados. No plano federal, foram aferidos 24 indicadores com dois implementados, o que representa 8,3% do total medido.


As ações voltadas ao redirecionamento da política de drogas para perspectivas de saúde e proteção social apresentam sinais de avanço em alguns estados. Em contrapartida, medidas para ampliar o uso de alternativas à prisão e garantir acesso célere à defesa ainda têm baixa implementação, especialmente em regiões com sobrecarga processual e limitações na rede de assistência jurídica. O desafio está em combinar esforços legislativos, gestão de vagas e articulação entre os entes do sistema de justiça.


Estrutura prisional e serviços

O eixo dedicado à melhoria das condições de custódia e dos serviços nas unidades tem 20 ações e 153 indicadores medidos no semestre. A média de execução estadual foi de 36,5%, e no bloco federal, dos 83 indicadores aferidos, 11 foram considerados implementados (13,3%).


Os resultados mostram um cenário heterogêneo. Algumas frentes avançaram, como a qualificação de inspeções judiciais, com protocolos adotados em diversas unidades da federação, e a implantação ou fortalecimento de escolas de formação para servidores penais, presente em 21 estados. Também se observam iniciativas pontuais em segurança alimentar, com estados adequando cardápios e processos de aquisição de alimentos, e em acesso a práticas esportivas, culturais e educacionais.


Por outro lado, persistem diferenças no alcance de serviços de saúde, na oferta estruturada de atividades laborais e na implementação de espaços adequados de convivência. Há estados que reportam inexistência de programas permanentes nessas áreas, e outros que concentram a execução em poucas unidades. A consolidação anual deverá captar a expansão de convênios e investimentos em andamento.


Processos de saída e articulação pós-cárcere

Com oito ações e 49 indicadores medidos no semestre, este eixo apresentou a maior média de execução entre os estados, 38,1%. No bloco federal, 31 indicadores foram aferidos e quatro implementados (12,9%). As medidas tratam de preparar a saída das pessoas privadas de liberdade, articular políticas de assistência social, trabalho e renda, viabilizar acesso à educação e regularizar pendências processuais.


Os dados mostram iniciativas em andamento para criar ou fortalecer fluxos formais de saída, integrando a rede socioassistencial e programas de empregabilidade. Em nove estados, já há parcerias com instituições de ensino para oferta educacional a pessoas egressas, e em dez há cooperação com o Sistema S para capacitação profissional. Quatro estados reportaram a existência de cooperativas ou empreendimentos voltados a essa população, demonstrando que essa prática ainda é pouco disseminada.


Políticas para não repetição

O último eixo do Plano reúne ações voltadas a impedir que o quadro de violações reconhecido pelo STF volte a se repetir. São medidas de caráter transversal que incluem o enfrentamento ao racismo em todas as etapas do ciclo penal, o fortalecimento das políticas penais e de seus orçamentos, o respeito a precedentes judiciais e normativas, além da padronização de informações para apoiar a tomada de decisão com base em evidências.


No semestre monitorado, o eixo apresentou a menor média de execução estadual, com 29,9%. Dos 76 indicadores previstos, 75 foram aferidos. No âmbito federal, 64 indicadores foram medidos e oito implementados (12,5%). Entre os avanços registrados, todas as unidades da federação que responderam ao monitoramento indicaram possuir Comitês de Políticas Penais formalizados, ainda que nem todos sigam integralmente as diretrizes do Guia de Implementação, como a inclusão da sociedade civil.


Outro destaque foi a criação de Câmaras Temáticas de Justiça Racial em 12 tribunais de justiça, voltadas a acompanhar e propor políticas antirracistas no sistema prisional. Apesar desses movimentos, grande parte das ações depende de ajustes de planejamento, atualização de bases de dados e institucionalização de rotinas de monitoramento para garantir que as mudanças previstas se consolidem.


Valorização das carreiras penais

O plano prevê também uma série de medidas voltadas à valorização dos servidores penais, reconhecendo que a sobrecarga de trabalho, a carência de condições adequadas e a falta de políticas de cuidado comprometem a execução das atividades e a segurança nas unidades.


Entre as metas, está a instituição da Política de Saúde Integral dos Trabalhadores do Sistema Prisional, ainda não implementada, e a criação de espaços de descompressão em 40% dos estabelecimentos até o final do plano. No primeiro ano, a meta era atingir 10%, percentual superado por 11 estados.


O plano também prevê ações que incluem estruturação de carreiras e de formas de progressão, formação e de adequação de perfil profissiográfico, mas a maioria dessas medidas ainda não foi iniciada na maior parte dos estados.


Texto: Renata Assumpção

Edição: Nataly Costa e Débora Zampier

Agência CNJ de Notícias

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